Slobber Knocker #140: "Slobber Knocker Road to Wrestlemania": Bray Wyatt vs Undertaker
Sejam bem-vindos a mais um Slobber
Knocker que se dirige à Wrestlemania com a mesma velocidade e
antecipação que toda a gente, diferenciando-se apenas pela larga
quantia de palavras aqui desperdiçadas para fazer antevisões
individuais.
E agora é altura para mais uma. Com
apenas dois fins-de-semana restantes, já era sabido que eu não ia
conseguir cobrir todos os combates, mas teria que seleccionar alguns.
Estava aberto à análise de qualquer um, logo decidi corresponder a
um pedido e voltei-me para o encontro das trevas que coloca Bray
Wyatt frente a Undertaker.
Já fica então adiantado que na
próxima semana, o último caberá ao main event, ficando combates
importantes como o encontro de Cena e Rusev ou o promissor ajuste de
contas de Randy Orton e Seth Rollins de fora. Nem sei como vão
acontecer sem eu falar neles. Mas cá me focarei noutro acontecimento
de importância que traz de volta uma certa lenda que perdeu qualquer
coisa neste pouco modesto evento que é a Wrestlemania...
O que ainda move isto:
Acho que é um ponto pertinente a
abordar. Aliás, com a construção a falar por si – e quando digo
isto, também digo que é Bray Wyatt que está a fazer tudo por si –
é quase o único ponto a focar. Já não existe uma streak a romper
e era isso que trazia Undertaker de volta aos nossos ecrãs todos os
anos. Então qual é o objectivo disto?
- Um passar de tocha. Parece ser o que
tem movido o próprio Wyatt, como ele mesmo já chegou a dizer.
Undertaker já está nos seus limites ou até, como muito se
acredita, além do seu limite. E Bray Wyatt quer ser a nova “cara
do medo” e tomar posse do posto como aquela personagem tenebrosa
que parece simpatizar com o sobrenatural. Uma vitória na
Wrestlemania, aquele grande palco onde o “Dead Man” é quase
imbatível, é uma boa forma de o enterrar ou de servir de último
prego no caixão, se for considerada a sua derrota na passada
Wrestlemania como o início do destrono. O que é mais questionável
é a necessidade de lhe tentarem dar a streak a ele. Nem eu acho que
isso se deva tornar algo que um lutador deve ter, nem acho que alguém
além de Undertaker devia ficar com essa marca. Ainda para mais sendo
tão arriscado. A streak de Undertaker foi acontecendo por acaso, não
se cria um 21-0 de propósito. Tinha que se garantir que daqui a 21
anos, ou mais se for para ultrapassar, o lutador, neste caso Bray
Wyatt, ainda esteja lá e capaz de competir. Uma tentativa fútil e
parece-me algo descabido que tentassem algo. Mas não me acredito que
vão por aí.
- A curiosidade mórbida. Apesar de
tudo, consta na mente de todos os fãs. Todos queremos saber como
está Undertaker. Em história vendem-no de forma semelhante, expondo
a curiosidade em saber o estado físico, mental e psicológico do
Dead Man após a devastadora derrota da Wrestlemania anterior. Nós
queremos ver até onde ele ainda conseguirá ir ou até onde ele já
conseguiu ir. É aquele masoquismo que existe na mente humana em
querer ver os seus ídolos após o pique da sua forma, cedendo à
idade e, no seu caso, ao desgaste físico extra que a sua profissão
requer. E o que o bom quer é olhar para Undertaker e ver que, mesmo
com um pesar de idade já impossível de esconder, aquele “velhote”
ainda está para as curvas e tem dedicação suficiente para dar tudo
de si a cada visita anual que nos faz. E, claro, também queremos ver
qual é a atitude que traz ao vir sem streak. Vem mais humilde ou com
uma cólera a trazer-lhe um lado mais animaleso e furioso?
- A
ousadia de Bray Wyatt. Comentadores estão incrédulos com tal
desafio e questionam a sanidade mental de Bray Wyatt que, realmente,
até então tinha sido sempre muito fino. Sim, Undertaker já não
tem uma streak invicta e já tem uma derrota na Wrestlemania. Mas
sim, ele tem 21 outras impressionantes vitórias, proporcionando um
rácio que o favorece de forma monstruosa. Sim, este Undertaker já
está mais velho e não está em tão boa forma. Mas não, não é
nenhum velho frágil com quem qualquer um se pode meter. Sim, é
verdade que as feuds recentes de Bray Wyatt têm sido uma bagunça
autêntica, como por exemplo os seus conflitos com John Cena, Chris
Jericho ou Dean Ambrose que eram tão promissoras. Mas não, ele não
se deixa cair tão facilmente. Com tudo isto, a questão que se
levanta com o seu desafio é a sua coragem. Ninguém acha que alguém
na sua perfeita sanidade mental desafiaria Undertaker na
Wrestlemania, com provocações e sem saber qual o seu estado mental.
Mas é claro que Bray Wyatt o faria, afinal de que tem ele medo? Será
esse sentimento algo que ele finalmente experimentará na
Wrestlemania?
- Redenção. É o que muitos esperam de
Undertaker. É muito pobre ver a streak como a única essência de
Undertaker e achar que ele não tem mais feitos além disso. Assim
como ver o “1” a anular o “21” que veio antes. Mas aqui pode
ser visto como algo devastador para o “Dead Man”. O desafio é de
Wyatt, mas pode muito bem ser uma missão para Taker. Tem aqui uma
chance de redimir a sua devastadora derrota da Wrestlemania anterior.
Não lhe reinstala o “0” mas aumenta para “22” e mostra que
afinal não está tudo acabado e que o “Morto” não está,
deveras, morto.
- O sobrenatural ainda vive! Já não vivemos na mesma era no que diz respeito a wrestling. Por muito que existam espectadores em negação, já não se podem fazer coisas como se faziam antigamente. E uma delas é apresentar uma personagem sobrenatural, vinda do oculto, com conexões à morte e com poderes que não parecem muito humanos. Aliás, se me perguntarem a mim, até acho que isto tinha tudo para não resultar em qualquer altura, se não tivessem dado ao tipo certo. Mas se é para manter as coisas nas trevas e a parecer saído de um filme de cagaço, Bray Wyatt mantém uma ponte entre o realismo e o surrealismo que pode ser o que se arranja nos dias de hoje. Um louco, que fala em modo críptico e lidera um culto no meio da floresta e que faz acções em nome de uma irmã imaginária... É algo que pode existir mesmo, há tolos piores. Só tem que se dar o toque e torcidela mais surreal para a coisa e temos uma personagem cativante. Não dá para ter outro Undertaker hoje, mas há Bray Wyatt e é bem bom. Juntando os dois, temos segmentos que nos podem transportar a outros tempos e juntar os dois “mundos”: exemplifique-se com o segmento da cadeira a arder no ringue.
- Fim à vista. O que se espera a cada ano. Que
Undertaker se despeça de nós e dos ringues. Não me parece algo que
venha cedo, dada a carreira preenchida que teve, as eras que viu
passar e presenciou, o legado que deixou e o desgaste físico que a
sua dedicação lhe causou. Acho que estamos todos preparados para
lhe dar uma última ovação de pé – já ficou aquele sentimento
na Wrestlemania XXX por acaso – e estamos sempre a ver se “é
desta”...
A feud
Não foi uma feud convencional. Mas lá têm vindo a construir a história ao longo das semanas, juntamente com todas as outras, a culminar na Wrestlemania. Mas não há aquele sentimento de rivalidade, pelo menos recíproca. Olhemos a ela por pontos.
- Bray Wyatt a trabalhar sozinho. É
óbvio que é ele que está a carregar toda a feud sozinho. O outro
nem aparece. Foi ele que começou com as promos vagas, foi ele que
rompeu o mistério – que já não era assim tão misterioso para a
maioria – e foi ele que prosseguiu com as mensagens obscuras a
lançar o desafio. É tudo por Wyatt. Se olharmos bem, Undertaker
nada fez e nada mais tinha a fazer a não ser uma mera resposta de
sim ou sopas. Parece ter respondido da melhor maneira e aparentando
levar os desafios provocantes a peito, ao atacar algo pessoal de
Wyatt. Se não fosse por isso, a feud estaria toda dum lado, com
Undertaker mantendo um papel passivo e receptivo, enquanto Wyatt
escrevia a história toda sozinho e tinha os problemas todos para si.
É caso para dizer que é Bray Wyatt quem tem carregado toda a feud,
que se desenvolve de forma pouco usual.
- As respostas de
Undertaker. Undertaker tem trabalhado à Sting. Aliás, com a
semelhança entre as formas de comunicação de ambos, ficamos a
ponderar como seria se realmente rivalizassem um com o outro. Ninguém
aparecia e só mandavam vídeos um ao outro. Com sorte, ainda era por
vídeo que lutavam e até já fiz essa observação humorística no
artigo anterior, que se referia a Sting e ao seu combate. Tem tido um
papel passivo e é possível que se guarde a sua grande revelação
para o próprio evento. O que me leva ao ponto seguinte.
- O
regresso. É aquela altura do ano e que se dá de forma assídua.
Undertaker regressa de alguma maneira. Ou é anunciado, ou vem de
surpresa ou é desafiado. Pela forma como as coisas estão a
decorrer, parece que querem abordar um diferente: o regresso só no
próprio evento – digo “parece” porque ainda há um Raw em
falta. Mas é claro que não o iam fazer chegar lá, fazer a sua
entrada e dizer “Quem quer andar ao milho?” e esperar que venha
algum corajoso. Lá se faz a tal história de um só homem, a
rivalidade-monólogo para que ele só venha na hora ou encima da
hora. Dá um ar muito divino à coisa: o tipo é tão enorme e
importante que é tido como um alvo e não um competidor normal –
tem-no sido nos últimos anos – que já nem precisa comparecer para
ser assunto naquele evento. Aparece tarde e só isso já é um
acontecimento. O que é facto aqui é que, pela primeira vez,
Undertaker já está confirmado no card da Wrestlemania, já tem a
sua história prestes a atingir o seu culminar e nós ainda à espera
do regresso anual. Sempre é diferente, mesmo que frustrante para
alguns e questionável para outros tantos.
- Dimensão. No futuro, terá sido maior para Bray Wyatt do que para Undertaker, ainda tendo muito em consideração o resultado. Undertaker já vem de carreira feita e tudo isto é feito para Wyatt. Esperemos que seja tudo bem feito para que o beneficie ao máximo. Assim poderá ser um momento gigante na carreira de Bray Wyatt, mesmo que no card de todo o evento se mantenha numa posição média-alta.
No combate
- Decorrer e resultado. Não será caso para roubar o espectáculo da forma que outros encontros recentes de Undertaker fizeram, mas acredito que será superior ao encontro com Brock Lesnar do ano passado que não seria um mínimo memorável se não fosse o chocante resultado. Terá uma base muito maior no factor psicológico do que no factor físico e tem dois competidores impecáveis para singrar nesse campo. Mas não lhe retiro mérito em termos de combate de wrestling, Undertaker já não consegue dar o que outrora já deu, mas ainda dá bastante e, aparentemente, mais do que o seu possível. E Wyatt encontra-se no seu pique e já tem um bom leque de grandes combates que agora só tem por onde se alastrar e enriquecer. Há-de mexer com emoções sem saltar para o topo da lista e ultrapassar alguns dos combates mais ansiados e que já levam uma expectativa maior. Quanto ao seu desfecho, muitos acham que Bray Wyatt é a saída mais lógica e esperada, enquanto outros veem isso como uma maior e prolongada desvalorização da streak – porque 2 > 21, de facto. Mas se me perguntarem a mim, é esse o caminho. Wyatt tem muito mais a perder do que Undertaker, ao sair por baixo. Mesmo que dê uma excelente prestação, como se espera que venha a dar.
-
Histórias. Como já disse anteriormente, o factor psicológico vai
entrar e em peso. Mas que histórias em particular é que poderão
entrar se não há aquela faísca pessoal, aquela troca de
galhardetes na construção da rivalidade, aquilo que leva ódio para
os fazer partir para a pancada imediata, logo após um olhar intenso?
Como não há algo assim desde que CM Punk se banhou nas “cinzas”
de Paul Bearer, terá que recair tudo sobre a tal história de
passagem do testemunho. A principal história será, em princípio, a
forma como Bray Wyatt não se deixa descair perante os jogos mentais
de Undertaker e, em vez disso, o contrário parece tomar forma.
Undertaker deverá encontrar-se no seu estado mental mais vulnerável
após a Wrestlemania XXX e Bray Wyatt apenas piorará as coisas,
mostrando um estado mental macabro com o qual Undertaker ainda não
tenha tido o hábito de lidar. Altercações pessoais para explorar
há poucas, logo este parece um caminho a percorrer por toda a
duração do combate.
- Público. Um público quieto em plena
Wrestlemania seria um público a pedir um corte de relações e que
deixasse de ter visitas da WWE. O que vale é que isso não acontece
e também se antevê loucura no Raw seguinte, como tem vindo a ser
tradição. E também está por haver um público que não reaja a
Undertaker. Bray Wyatt tambem anda lá no topo no que toca ao
controlo de plateias. Não existe aqui nada que mate um público e,
se eles explorarem bem a parte psicológica, existem muitos spots
para causar emoções sonoras. Uma nova derrota de Undertaker já não
deve causar aquela onde de choque que existiu no ano passado – e
que, para mim, permanecerá como o maior momento de Wrestlemania do
meu tempo – mas deve fazer qualquer coisinha.
-
Posicionamento. No card, normalmente, Undertaker é sempre tratado
como um main eventer secundário. Talvez o hype e sentimento que
existe à volta deste não seja assim tão grande, mas acaba por ser.
No ano passado foi estrategicamente posicionado antes do main event,
com o combate de Divas pelo meio para deixar o público digerir o
resultado. Este ano não há a necessidade para tal e é possível
que antecipem o encontro um pouco mais para o meio do card. Em
qualidade, não sei se terá material para pódio mas acredito que
seja memorável e suficientemente citado e referenciado nos dias
seguintes.
- Futuro. Undertaker perde mas não vai embora. Brock Lesnar retém o título e Undertaker desafia-o para se redimir e enfrenta-o pelo título no Extreme Rules e vence. Como qualquer combate recente, fica devastado e nem se consegue levantar, o que permite a Seth Rollins um cash-in imediato que lhe dá o título. Undertaker volta a ausentar-se até à Wrestlemania do ano seguinte, onde caçará Seth Rollins que provavelmente já não é Campeão e desafia-o para o evento, possivelmente proporcionando a sua terceira derrota numa brincadeira que já não é o que era. Ou então outra opção: nada disto acontece. Até porque foi uma ideia que me passou pela cabeça numa de “E se...” em vez de “Havia de...” Não inclino muito o meu gosto para isto. O futuro mais simples e mais certo é que Undertaker volte a ausentar-se. Possivelmente retirar-se de forma definitiva desta vez, começa a fazer-se tempo e ele não vai aguentar à rasca para sempre. E Bray Wyatt só tem que capitalizar em ser o “New Face of Fear”. Com isto quero eu dizer que ele vai para o main event sem sair de muito longe de lá.
Antevisão pessoal
Pessoalmente, tenho uma boa expectativa em relação a este combate mesmo que não espere algo de extraordinário. Mas para ser muito honesto, é assim que me sinto em relação a toda a Wrestlemania XXXI – sim, eu vou continuar a numerar por muito que eles não queiram, eu e o Daniel Bryan ainda estamos juntos nisto. Muitos veem o evento como fraco, enquanto eu lhe vejo potencial e poder e talento para uma execução de sucesso. Não acredito que seja melhor que a XXX, até porque considero essa a melhor dos últimos anos, mas acredito que esteja bem entretido e suficientemente empolgado ao longo de todo o evento.
Em
relação ao resultado, também pendo para a vitória de Bray Wyatt,
sem achar que Undertaker fique prejudicado no meio disto. Já uma
carreira bem jeitosa tem ele para confortar qualquer escorregadela
que dê agora quando já não tem nada a provar a ninguém. Só acho
que o desafio de Wyatt é que tem um impacto diferente. Ele já não
está a desafiar a streak, já está a desafiar todo o legado e até
a imagem de Undertaker. É claro que isso permanecerá intocável mas
Wyatt vem causar um abanão que apenas lhe beneficiará a ele mesmo.
Um bom combate e até acredito que
tramem alguma que dê que falar um mínimo nos dias seguintes. E, não
quero arriscar a aposta porque teimam sempre, mas se calhar até é
esta a última performance do “Dead Man”. E é dos poucos que não
deixa nada por fazer.
Qualquer coisa mais que achem que se
deva falar em relação a este combate, deixo para vocês, visto que
acho que tenho que chegue para a minha análise por aqui. Espero que
tenha focado pontos suficientes, visto que muitas das vezes combates
de Wrestlemania devem ser eventos que falem por si. E espero que
tenha sido a gosto e que vos encoraje a participar. É isso que
procuro. Para além de comentar todo o artigo, há sempre algo mais
para debater:
“Acham que este combate tem o mesmo
impacto que teria se ainda existisse a streak?”
Com essa nota me despeço e planeio
voltar na próxima semana com a análise ao main event, envolvendo o
WWE World Heavyweight Championship, Brock Lesnar e Roman Reigns. Como
sempre, procuro fazê-lo de forma diferente. E espero que estejam cá
para acompanhar. Até lá só espero que fiquem bem e aproveitem
estas entradas Primaveris. E aproveitem estes últimos ares de Road
to Wrestlemania porque ela já está quase aí!
Cumprimentos,
Chris JRM